texto de Júlia Conterno
Fomos conferir a mesa A Mulher na Música Instrumental, parte da programação da V Mostra Jazz dia 26.06 no Museu da Imagem e do Som (MIS) de Campinas
Estiveram presentes a pesquisadora de sociologia do trabalho nas artes, Liliana Rolfsen Petrilli Segnini, a musicista Ieda Cruz, a bailarina, pesquisadora e produtora Daniela Alvares Beskow, e a musicista Sofia Barion. A mediação foi da Malu Arruda, pesquisadora e produtora.
Foi uma mesa muito rica e pela primeira vez pudemos escutar o que nossas amigas musicistas, em específico, têm a dizer.
É sempre difícil olhar para os dados sobre o mundo do trabalho das mulheres: ganhamos menos em todos os espaços, trabalhamos mais, possuímos em geral muito maior formação e competência do que homens que ocupam cargos de decisão e poder – e no mundo das artes e da cultura isso não é diferente.
O debate reafirmou pra gente a importância de se esmiuçar a categoria <trabalho> para aqueles que se dedicam às artes profissionalmente.
Com um olhar atento, rapidamente se conclui que a maioria de nós, trabalhadores das artes e da cultura, estamos precarizados – sem carteira assinada, vivendo de cachê em cachê, sem renda fixa, sem seguridade social, sem férias, sem licença maternidade / paternidade. E essa precarização se agrava ainda mais sobre as mulheres, que são menos convidadas para trabalhos, recebem menos, vivenciam diversos tipos de violência em seus cotidianos, não contam com o suporte necessário do Estado, do setor privado e de seus companheiros quando passam pela maternidade e trabalham mais horas do que os homens (considerando a soma: trabalhos domésticos, de cuidados e trabalho principal) – a Dani trouxe dados do PNUD de que mulheres trabalham, em média, 7,5 horas a mais em tarefas domésticas por semana do que os homens.
Foi doloroso escutar os relatos de violências sofridas pelas companheiras musicistas Ieda Cruz e Sofia Barion, com a especificidade de transitarem pelo meio da música instrumental – ambiente altamente machista, onde mulheres devem provar e provar, dia após dia, uma capacidade quase sobre-humana de executar um instrumento –muito diferente da exigência dirigida aos homens. Quase não há espaço para o erro e para um aprendizado colaborativo. Ao contrário, há uma lente de aumento sobre suas condutas e a explícita mensagem de que estão ocupando lugares onde não foram chamadas.
É isso... As regras do jogo não são as nossas. Participamos de espaços onde não somos nem esperadas e nem convidadas, e isso é incrivelmente violento.
O que podemos fazer no nosso cotidiano, para mudar um pouco esse cenário? Chamem mulheres para trabalhos nas artes, valorize mulheres artistas (citando-as, divulgando suas fotos, seus trabalhos, pagando justamente), convide-as para mesas e debates, formem equipes de criação e execução com mais mulheres.
Mulheres, vamos nos aproximar ainda mais e nos permitir enxergar e construir a NOSSA forma de trabalho: com mais colaboração, sensibilidade, suporte etc.
Por mais espaços de debates como esse. Parabéns à Mostra Jazz Campinas pela organização da mesa – e que, na próxima edição, vejamos muito mais do que 5 mulheres entre os mais de 100 artistas participantes da programação musical
Publicado em 28 de junho de 2019
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